Na manhã da última quarta-feira, o Presidente da ACMP, Manuel Pinheiro, e o 1º Vice-Presidente da entidade, José Wilson Sales, estiveram reunidos com a Procuradora-Geral de Justiça, Socorro França, e com o Secretário de Segurança Pública e Defesa Social, Roberto Monteiro, para tratar de problemas, de ordem constitucional e de ordem prática, relacionados ao Programa Pró-Cidadania, que foi criado pela Lei Estadual 14.318/09.
De acordo com os relatos de alguns promotores de Justiça que chegaram até a entidade de classe, os agentes de cidadania, que são subordinados aos prefeitos municipais, estariam desempenhando funções de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública, funções estas que somente poderiam ser desempenhadas por policiais militares, subordinados ao Governador do Estado, de acordo com os §§ 5º e 6º do Art. 144 da Constituição Federal e com o Art. 188 da Constituição Estadual.
O Inc. III da Art. 7º da Lei Estadual 14.318/09 atribui aos agentes de cidadania “colaborar na prevenção de atos e ações que venham a proporcionar a ocorrência de crimes ou danos físico-psíquicos aos integrantes da comunidade ou aos seus patrimônios, respeitadas as atribuições específicas e constitucionais de outras instituições”, sendo que, com base em tal dispositivo, algumas prefeituras, como é o caso da de Ipu, estariam lotando os agentes de cidadania para trabalhar em “Grupamentos Policiais Militares”, sob a autoridade do Chefe do Poder Executivo Municipal.
De acordo com o Promotor de Justiça de Ipu, Kennedy Carvalho, os agentes de cidadania estariam dando buscas pessoais de armas, realizando blitzes em veículos, agindo como se fossem verdadeiros policiais militares: “O cidadão que vê alguém usando uniforme militar, portando arma, mesmo que não seja letal, trafegando em viatura oficial equipada com sirene, efetuando rondas e abordagens pessoais, logo identifica um policial, mesmo que a Lei diga que ele é apenas um Agente de Cidadania”.
O Presidente da ACMP afirma que o Inc. III da Art. 7º da Lei Estadual 14.318/09 é incompatível com o Art. 188 da Constituição Estadual, que dispõe ser incumbência da Polícia Militar “a atividade da preservação da ordem pública em todas as suas modalidades e proteção individual, com desempenhos ostensivos para inibir os atos atentatórios a pessoas e bens”.
Segundo Manuel Pinheiro, a Constituição não admite que agentes subordinados ao Poder Executivo Municipal possam desempenhar tais funções: “Quando dividiram as competências entre a União, os Estados e os Municípios e negaram ao poder municipal qualquer autoridade em matéria de segurança pública, os constituintes tentaram afastar a influência das rivalidades políticas locais sobre as ações realizadas pelas forças policiais. Até a metade do século passado, quando as autoridades locais comandavam a segurança pública, as forças policiais costumavam outorgar privilégios para os aliados e praticar arbitrariedades contra os adversários dos prefeitos e das demais autoridades municipais. Porém, desde a Constituição de 1.946, as atividades relacionadas com a segurança interna e a manutenção da ordem sempre foram confiadas às policias militares dos Estados, sob comando dos governadores. A idéia de Prefeito fazendo a nomeação, decidindo a lotação, pagando a remuneração, fiscalizando a atuação, enfim, comandando quaisquer agentes que trabalham na segurança pública é absolutamente anacrônica, ela lembra os tempos do Império e da República Velha... Há um risco enorme de que esses batalhões comandados pelos prefeitos dêem tratamento privilegiado aos seus correligionários e persigam os seus opositores, especialmente na prevenção dos crimes eleitorais”.
O Presidente da ACMP elogiou a mudança de filosofia no comando da SSPDS e defendeu a universalização do modelo de policiamento comunitário, mas criticou o empoderamento das prefeituras municipais em matéria de segurança pública. Segundo ele, as boas intenções do programa do Programa Pró-Cidadania não podem justificar retrocessos institucionais: “Para que houvesse compatibilidade do Programa com a Constituição Federal e a Constituição Estadual, os agentes de cidadania deveriam pertencer aos quadros da Polícia Militar, concursados, nomeados, lotados, remunerados, fiscalizados e comandados pelo Governo do Estado. A contrapartida das prefeituras poderia ser através da aquisição das viaturas, dos equipamentos de transmissão, das armas não letais, dos uniformes e da instalação das sedes nos municípios e nos distritos, tudo de acordo com os padrões estabelecidos pela Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social. Estes ajustes manteriam os benefícios do modelo de policiamento comunitário, sem os riscos de abusos e desvios por influência das autoridades locais”.
Após a conversa de ontem com o Secretário de Segurança Pública e Defesa Social, Roberto Monteiro, os diretores da Associação Cearense do Ministério Público aguardam uma sinalização concreta do Governo do Estado, no sentido de realizar os ajustes no Programa Pró-Cidadania aos ditames constitucionais. Conforme a resposta do Governo, a entidade de classe não descarta a possibilidade de ingressar com uma Ação Declaratória de Inconstitucionalidade da Lei Estadual 14.318/09, junto ao Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.
Fonte: ACMP